terça-feira, 30 de março de 2010

Cineterapia com Trainspotting - Epílogo



Nosso encontro aconteceu graças ao Sindbancários e seu cinema, o Cinebancários, que nos tratam com tanto carinho. Agradecemos à Bia Barcelos, ao Mauro e à equipe do cinema.

Ainda, agradecemos ao Fabrício Carpinejar, que dedicou tempo nos ajudando como assessor de imprensa – e que trabalho bem executado: tivemos mais de 50 pessoas na audiência.

O Cineterapia está programado para a última segunda-feira de cada mês, sempre com exibições gratuitas e abertas aos interessados.

Isso tudo iniciou na sala de aula, no Curso de Instrução do Acompanhante terapêutico. Sim, Curso de Instrução do AT. Porque precisamos primeiro aprender a nos acompanhar, cada um a si, para depois ajudar o outro. Nova turma inicia nesta quinta-feira, 1o de abril.

O AT é um terapeuta que caminha, um pouco mais que um amigo qualificado, um pouco mais que uma babá. O AT empresta seu corpo para quem está perdido. É o leão de chácara das crises. A ponte entre o consultório e a cidade. Igual que o paciente, o terapeuta, na rua, aprende muito sobre ele mesmo. Fora da proteção do consultório, fora do papel fixo da poltrona, o acompanhante vira movimento. Eis a saúde - porque a doença é quando tudo está parado.

O Cinema na sala de aula é um instrumento poderoso, porque poucos escapam de se emocionar com bons filmes. Poucos escapam de aprender quando se emocionam.

Trouxemos a sala de aula para o cinema. Porque, como acontece com o AT, quando saímos de casa e vamos ao cinema, somos outros. E com novas versões de nós mesmos, vivemos com mais intensidade.

Abrimos à comunidade. Porque, como acontece na rua, no meio de muita gente, ficamos mais frágeis e preferimos andar aos pares.

São truques para viver melhor.

O filme, Trainspotting, romance de Irvine Welsh transformado em cult pelas mãos do cineasta Danny Boyle, é um drama britânico lançado em 1996, consagrou o autor escocês como uma das vozes mais representativas de sua geração.


O debate contou com o professor Guilherme Vollmer, psiquiatra (HCPA/UFRGS), psicanalista (SPPA) e especialista em DQ (UNIFESP), além de cinéfilo.

Com mais de 15 anos de prática na área, Dr. Guilherme ofereceu uma aula a respeito dos opiáceos, sua origem geográfica, histórica e seus derivados atuais. Versou a respeito do Crack e das dificuldades enfrentadas na clínica em relação a dependência violenta e suas consequência.

Ainda, aprendemos sobre a importância do apoio familiar e de outras pessoas próximas na recuperação dos dependentes, a importância da paciência e da capacidade de tolerar a frustração quando lidamos com índices de recaída em torno de 15 a 20%. Desvendou a questão narcisista do usuário, frágil em busca de prazer imediato.

O professor Vollmer enfatizou a dificuldade que as crianças enfrentam, já que iniciam o uso de drogas muito precocemente, em torno dos doze ou treze anos, e a gravidade que isso acarreta ao prognóstico. Ainda, acrescentou dados sobre o Santo Daime e sua controversa legalização. Muito claro e conciso, o professor Guilherme esclareceu as várias dúvidas do público que se manifestou grandemente.

Deixou seu email (guivollmer@hotmail.com), para contato e esclarecimentos posteriores.

Fomos felizes da companhia agradável e muito informativa.

Cineterapia com Trainspotting - outra versão



O Dr. Odon Cavalcanti, soube da proposta do filme e enviou suas anotações a respeito. Confira a opinião do experiente psiquiatra.

Trainspotting

Outros títulos: Os insaciáveis; Os Incapazes Incuráveis; Os destruidores dos outros e de si; Quando o outro é invisível; Bebês e Adolescentes Esquecidos

Ao escrever estas anotações, lembrei do teu artigo da segunda semana do bebê sobre o erotismo da amamentação. São pessoas que, provavelmente, quando bebês, não foram erotizadas. Foi quando começou o trainspotting, com a soma dos gens e das circunstâncias da vida das pessoas a partir da fecundação e do nascimento, focando especialmente as emoções do primeiro ano de vida.

O filme é desconfortável, às vezes pelo realismo pesado e pelo nojo de algumas cenas, que apesar de fortes, estão longe de realidades associadas às drogas, aos transtornos de personalidade e ao sadismo às vezes intenso das pessoas – no lançamento, muitas pessoas se retiraram do cinema.

O autor do texto, do roteiro e o diretor foram hábeis, os dois primeiros em pinçar o que é importante para gerar os insaciáveis, e o segundo por manter um clima ágil que possibilita acompanhar o filme até o final.

Os que assistem gostam do filme, desconfio que não sabem bem porque, pois ele nos leva mais a intuir ¹ a compreensão da tragédia dos amantes da heroína. O transcorrer do filme assinala o nascedouro do drama com a presença freqüente e o andar solitário de um bebê.

O autor do livro Irving Welsh e o roteirista dão ênfase às influências do consumismo e da economia de mercado ao mostrar os jovens como vítimas da atual ordem social. Mostram também a força dos dramas interiores das almas, carentes de cuidados, que em conseqüência se desorganizam. Welsh, num dos extras do filme assinala “que para o novo milênio o grande desafio é de dividir o bolo mais justamente”. Entende-se esta justiça para os cuidados afetivos, para a escolaridade e condições sócio-econômicas que revelem um aceitar do outro.

O filme conta aspectos da vida de quatro adultos jovens ligados à heroína: Mark Renton, Sick Boy, Slud e Tommy. Incorpora-se ao grupo Beagbe, violento, compatível com lesão irritativa cerebral do lobo temporal.

No início correm pela cidade em busca de aventuras e prazer. É um desespero em busca de um prazer maior. Na cena seguinte Sick Boy injeta heroína no braço de uma mulher e lhe diz que vai ser melhor que o orgasmo, logo ela lhe responde, iluminada: “é melhor que qualquer pinto”. Não de 1, de 100, é melhor do que todos os pintos. Slud não resiste, beija a boca de Sick Boy, sofregamente. Não é sexo nem tensão homossexual. É um vampirizar do prazer que dos dois emergia no injetar e receber o prazer da droga.

Numa outra cena Mark Renton compra droga da “Madre Superiora” e que naquela ocasião só tinha supositórios de heroína. Numa crise de incontinência retal encontra “a pior latrina da Escócia”, entra dentro de um vaso sanitário e mergulha com prazer num imenso lago azul-marrom. Foi um mergulho em épocas de sua pré-história feliz. Sem dúvida horrorizou aqueles com mais âncoras nesse período.

Abandonavam a droga e retornavam à droga. Renton comenta: “esta é a última ingestão das últimas”. São ciclos de delírio e incapacidade de compreender o que se passa.

Quando procuram empregos são até transparentes: “gosto de todas as pessoas e até de quem ninguém gosta”; “gosto de dar prazer aos outros, sou ótimo no lazer”. Infelizmente não sabem o que é prazer ou lazer, foram construídos sem essas capacitações. Sabem ser francos como Renton: “uso droga, fumo, engulo, enfio no rabo, injeto nas veias, vivo do seguro social e de pequenos roubos”.

Nas relações com as mulheres, nos intervalos do uso das drogas, só sabem receber. O sexo é vazio, sem afetos, não sabem compartilhar. Entendem quase nada do que seja parceria.

Quando morreu o bebê, perguntam quem foi o pai. Na verdade todos eram muito aquele bebê: o bebê carente e abandonado. Todos se sentiam-se assim, era o sentimento que os igualava e que fragilmente os unia. Seus afetos eram pobres, mais uma solidariedade animal. Quem os acolhia e ajudava era o "Madre Superiora", que fornecia a droga.

Quando Mark se apossou do dinheiro, foi e não foi roubo. Até foi justo (um pouco) em deixar uma parte para Slud, o único que referiu presentear a mãe. Talvez nem soubesse como fazê-lo.

Mark R., no final, ameaça com projetos: verdadeiros? , caretas? , falsos? . Ninguém sabe, foi o que mais avançou no entendimento de si e dos companheiros. Tinha pais, mesmo adulto, muito presentes e acolhedores. As reflexões dele durante o filme ameaçam ser salvadoras.

O que fazer com a legião de drogaditos e personalidades desorganizadas? Serão necessários não poucos cuidadores e que tenham capacidade para abraçá-los que é o que eles menos sabem na vida. Os que alcançam mais sucesso com os mais graves são os grupos religiosos, as organizações de alcoolismo e drogadição anônimos e as fazendas terapêuticas.

Surpreendentemente, as universidades e o estado são quase um zero à esquerda. Este último então tem em seu cardápio prisões cem vezes piores que o pior do que o filme mostrava.

Os cuidadores têm que ser disponíveis, afetivos e efetivamente atentos as suas próprias carências e, portanto compreensivos com as necessidades dos seus pacientes.

E a prevenção?

(Cuidados + Afetos + Estimulação) dos bebês

É complemento imprescindível o Teaser que aparece no trailer. É a mensagem síntese de Trainspotting.

Mark Renton está amarrado nos trilhos pelos três companheiros que correm se afastando. Ele, indiferente mesmo, pensa, poderia ter sido ele que os tivesse amarrado nos trilhos. Está sorridente (autenticamente) e pensa que o trem poderia se atrasar! Com o mesmo sorriso que viveu vai morrer. Esta é a verdade? É uma visão dos mistérios da vida e da morte.

____________________________________
¹ são os que reconhecem no fundo das suas almas sementes de temática similares.

domingo, 28 de março de 2010

Cineterapia - dia 29/03, 20h


Zero Hora, Caderno Vida,
27 de março de 2010 | N° 16287
POR AÍ

Cineterapia


Trainspotting, de Danny Boyle, será exibido na segunda-feira no Cineterapia, às 20h, no Cinebancários (Rua General Câmara, 424, Capital). Após o filme, o psiquiatra Carlos Alberto Iglesias Salgado, coordenador do Departamento de Dependência Química da Associação de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, falará sobre o uso de drogas. O objetivo dos encontros, previstos para a última segunda-feira do mês, é discutir temas como alienação parental, precocidade sexual e fobias. A entrada é franca. Reservas: atendimento@clinicaverri.com.br

Expectativa

Uma amiga escreve sobre o encontro com o AT:

EXPECTATIVA…



Num dia um tanto turbulento
Estava eu apreensiva
Conheci alguém que me deu alento
Me ouvindo, sempre compreensiva


Pediu-me ela
Que sobre nosso encontro escrevesse
Descrevendo o sentimento que me flagela
Para que me entendesse


Mais um pedido me foi feito
Com o qual estou tentando me adaptar
Mudar em meus escritos o sujeito
Para que juntas possamos trabalhar


Habituada a só ouvir minha voz
Pareceu-me um tanto estranho
Substituir o eu por nós
É um esforço tamanho


Estou muito ansiosa
Esperando nossa próxima sessão
Para ler seus escritos estou curiosa
E conhecer um outro universo irei então.

Hendaira

quarta-feira, 10 de março de 2010

Andamios: grupo de ATs argentino

ANDAMIOS - Acompañamiento Terapéutico é um grupo de Acompanhantes Terapêuticos da Argentina. Eles estão no Facebook e se apresentam assim:

Cold in hand blues

y qué es lo que vas a decir
voy a decir solamente algo
y qué es lo que vas a hacer
voy a ocultarme en el lenguaje
y por qué
tengo miedo

(Alejandra Pizarnik. El infierno Musical, 1971)



que, numa tradução breve, seria:


Cold in hand blues


e o que vais dizer
vou dizer somente algo
e o que vais fazer
vou me esconder na linguagem
e por quê
tenho medo


Alejandra Pizarnik, poeta argentina, nasceu em Buenos Aires, em 1936. Graduada pela UBA (Universidad de Buenos Aires) em Letras e Filofia, viveu anos em Paris, onde estudou Literatura na Sorbonne e trabalhou em jornais e revistas, colaborando com traduções de Antonin Artaud e Cesairé, entre outros. 
Alejandra escreveu: 
«La tierra más ajena» em 1955, «La última inocencia» em 1956, «Las aventuras perdidas» em 1958, «Árbol de diana» em 1962, «Los trabajos y las noches» em 1965, «Extracción de la piedra de locura» em 1968, «El infierno musical» em 1971 e «Textos de sombra y últimos poemas», publicação póstuma de 1982. 
Morreu em 1972, como consequência de grave depressão.

Contato: at.andamios@gmail.com
ANDAMIOS - Acompañamiento Terapéutico (Equipo de Acompañantes Terapéuticos)

Fontes: www.facebook.com ; www.amediavoz.com .

terça-feira, 2 de março de 2010

Trainspotting é o próximo filme do CINETERAPIA



29/03, 20h, no Cinebancários -
Rua General Câmara, 424 - Centro
(Pertinho do Theatro São Pedro)
EVENTO GRATUITO


O Sindibancários e o Espaço Cultural Clínica Verri selaram um pacto e quem ganha é você.

Agora, uma vez por mês, você pode ir ao cinema de graça e curtir ótimos diálogos com psiquiatras, terapeutas e outras personalidades.

A estréia do ciclo fica por conta de Trainspotting e do Dr. Carlos Alberto Iglesias Salgado.

Para a exibição do filme, a Channel 4 da Inglaterra cedeu os direitos especialmente para o evento.

[Sobre o Convidado]
Carlos Alberto Iglesias Salgado é o novo presidente da Abead (gestão 2010/2011), eleito durante o XX Congresso Brasileiro da entidade, em Bento Gonçalves. É psiquiatra com mestrado em Psiquiatria pela UFRGS. Especialista em Dependência Química pela Unifesp. Coordenador do Ambulatório de Dependência Química do Hospital Presidente Vargas e preceptor de Residência Médica em Psiquiatria no mesmo local. É o atual coordenador do Departamento de Dependência Química da Associação de Psiquiatria do Rio Grande do Sul.

[Sobre o Filme]
Trainspotting, livro transformado em cult pelas mãos do cineasta Danny Boyle, drama britânico lançado em 1996, consagrou Irvine Welsh como uma das vozes mais representativas de sua geração.

[Sinopse]
Trainspotting, na gíria escocesa, é uma atividade sem sentido, algo que é uma total perda de tempo. Essa expressão resume as vidas de Rents, Sick Boy, Tommy, Matty, Spud e Begbie, jovens moradores de Edimburgo que passam a maior parte de seu tempo se embebedando em pubs, arrumando confusão, assistindo a jogos de futebol pela televisão e, principalmente, se drogando. A heroína é a droga preferida, um barato que dura tempo suficiente para aplacar a banalidade da existência. Pelo menos até o próximo pico.

Explicitando toda a dor e a banalidade de ser jovem em um mundo de portas fechadas, onde a maior oportunidade que se pode esperar é conseguir um emprego reles em uma grande empresa, ter filhos e desfrutar de uma velhice obesa, Irvine Welsh narra, com ironia e sem meias palavras, o cotidiano de jovens que renunciaram a tudo isso, que preferem se perder em um mundo de contravenções, vagar pelas ruas sem rumo, a ceder a uma vida adulta que não faz o mínimo sentido.


[Principais Prêmios e Indicações]

Oscar 1997 (EUA)

* Indicado na categoria de melhor roteiro adaptado.

Eleito pela Times um dos melhores 1000 filmes já feitos, em 2004.

BAFTA 1996 (Reino Unido)

* Venceu na categoria de melhor roteiro adaptado.
* Indicado nas categorias de melhor filme britânico (Prêmio Alexander Korda).

Prêmio Bodil 1997 (Dinamarca)

* Venceu na categoria de melhor filme não-americano.

Brit Awards 1997 (Reino Unido)

* Venceu na categoria de melhor trilha sonora.

Independent Spirit Awards 1997 (EUA)

* Indicado na categoria de melhor filme estrangeiro.


Reservas de ingressos deverão ser feitas por email
(atendimento@clinicaverri.com.br)
e serão válidas até 20 minutos antes da sessão.